Mensagem do Presidente - março 2021

Eis-nos chegados a março, altura do tão esperado desconfinamento e que vem encontrar o setor da Eletricidade Renovável, mais uma vez, num momento singular da sua história.

 

Se é verdade que as notícias a nível europeu e locais são e têm sido animadoras, com uma série de estratégias e diretivas aprovadas em prol da mitigação do impacto das alterações climáticas, com um forte apoio na aposta nas tecnologias renováveis, também é verdade que há ainda muitos desafios para ultrapassar.

 

Numa altura em que as renováveis estão cada vez mais fortes (e recomendam-se), e que tenho o prazer de referir que, em fevereiro, se registou uma geração de eletricidade no nosso país de 88,5% renovável, vemos ainda surgir, de vez em quando e de forma muito isolada, alguns apelos à utilidade do carvão para produção de eletricidade.

 

O carvão observa um claro e positivo declínio. A prova flagrante aconteceu com o tão falado fecho da central de Sines. Mas o tema não está a ser tratado com a mesma emergência no resto do mundo. Pese embora nos cheguem finalmente boas perspetivas por parte dos Estados Unidos da América, se olharmos para os gigantes asiáticos, a luta não é tão linear: a China e a Índia, por exemplo, tencionam chegar aos 75.000 MWh de potência a carvão, um número gigantesco e que pode confundir os mais desatentos.

 

A explicação para esta diferença não é simples, mas existe. Tanto a China como a Índia têm nos seus territórios elevadas reservas de carvão, ao contrário de Portugal. Por outro lado, estamos a falar de economias em forte expansão, mas ainda com índice de pobreza significativo. Por exemplo, o PIB per capita da China é de cerca de 10.200 dólares e da Índia de 2.000 dólares, enquanto que em Portugal é de 23.200 dólares (como referem as estatísticas do Banco Mundial para 2019). Estes países enfrentam também desafios socioeconómicos completamente díspares da realidade Europeia e Nacional.

 

Além disso, no top 50 das cidades mais poluídas encontram-se 26 cidades da Índia e 14 da China, devido à elevada dependência dos combustíveis fosseis, nomeadamente de carvão que, para além das emissões de CO2, é responsável pela emissão de gases como o SO2 e o NOx, que são a causa de várias doenças respiratórias.

 

Portugal, por sua vez, em termos de recursos endógenos, é rico e consequentemente competitivo na produção de eletricidade a partir de fontes renováveis, tendo as condições ideais para suportar uma transição energética custo-eficaz com uma contribuição determinante para a redução dos custos de produção de eletricidade, com base nas tecnologias disponíveis atualmente.

 

Mas, como referi inicialmente, ainda não chegámos à meta. No passado dia 8 de março a APREN realizou mais um dos seus Debates Renováveis. Com a moderação da Susana Serôdio (APREN), e a participação de Ana Guerreiro (Generg), Timóteo Monteiro (EDP Renováveis) e do Prof. António Sá da Costa (APREN), a quem aproveitamos para agradecer o valioso contributo, ficou muito claro que há ainda um grande caminho a percorrer no que toca ao licenciamento dos projetos de renováveis. Tendo em conta as metas estabelecidas a nível europeu e replicadas localmente, a demora no processo de licenciamento tem claramente de ser resolvida o mais rapidamente possível, sob pena de falharmos o nosso potencial enquanto nação de vanguarda no que toca à aposta em energias renováveis.

 

A necessidade de simplificação no caso do licenciamento aplica-se também à utilização dos fundos europeus de recuperação económica – a chamada “bazooka”. Tive recentemente a oportunidade de falar sobre o assunto num debate Expresso/Deloitte, onde deixei clara a minha posição sobre o assunto, alertando para a necessidade de simplificar todos os processos desde a candidatura à atribuição dos fundos, passando pelos pareceres necessários à execução dos projetos de investimento, sob o risco de perdermos esta grande oportunidade para o setor.

 

Por fim, debruço-me sobre o Plano de Recuperação e Resiliência, um documento sobre o qual a APREN teve a oportunidade de tecer o seu comentário através da consulta pública aberta para o efeito durante duas semanas. A APREN considera que apesar de esforço para cobrir áreas importantes como a eficiência energética e a bioeconomia, o documento negligencia temas que constituem hoje barreiras à descarbonização e considera que a outros não lhes foi dada a relevância que seria esperada, como é o caso do hidrogénio renovável, do aumento da capilaridade e capacidade da RESP, aumento da capacidade de abastecimento e carregamento de veículos elétricos e a hidrogénio, mecanismos de apoio ao ganho de economias de escala massificação do eólico off-shore, apoios à economia circular para o sector renovável, aumento da capacidade das instituições afetas aos processos de licenciamento entre outros.

 

Neste sentido, reforçámos, na nossa resposta, que o PRR deveria incluir investimentos em áreas como: as infraestruturas de rede, permitindo a transição do sistema de energia por forma a capacitar e expandir a atual rede elétrica de serviço público em linha com os objetivos de capacidade do PNEC 2030, estabelecer e readaptar infraestruturas para o hidrogénio, redes elétricas inteligentes e redes para o offshore e armazenamento de energia; reformas para o planeamento integrado de território para identificar locais para a exploração de energia renovável e locais de resíduos de calor; garantir a sustentabilidade ambiental em coordenação com as medidas para a floresta, por forma a garantir um uso sustentável da procura e uso da bioenergia; Remover as barreiras administrativas e garantir qualificações: para aumentar a eletricidade

 

renovável e o hidrogénio renovável é necessário garantir que as entidades administrativas sejam reforçadas em termo de recursos e meios de IT para dar reposta os desafios, principalmente nas áreas de licenciamento, de planeamento e de monitorização e controlo.

 

A APREN gostaria de ressalvar que, o setor das energias renováveis apesar de não ter sido dos setores mais fustigados pela pandemia COVID-19, viu muitos dos seus desenvolvimentos e projetos serem adiados com repercussões danosas na estabilidade das empresas. Por outro lado, presentemente as barreiras já existentes agravaram-se severamente, sendo imperativo que se comece a trabalhar numa visão mais holística e integrada de todo o setor de geração de eletricidade.

 

Já muito se fez neste caminho para a descarbonização da economia, mas falta-nos e urge passarmos à prática.

 

Portugal precisa da nossa energia!