Mensagem do Presidente | Maio 2018

Assinalam-se este mês trinta anos da publicação do Decreto-lei 189/88 de 27 de maio. Esta data foi um marco fundamental, que permitiu que Portugal conseguisse ter o setor de produção de eletricidade que tem hoje.

 

Talvez poucos tenham presente que após a Revolução de 25 de abril de 1974 todo o setor elétrico português foi nacionalizado, vindo a integrar a EDP, que foi constituída em 1976. O DL 189/88 veio permitir a abertura ao setor privado da produção de eletricidade, embora apenas com base em centrais hídricas até 10 MW (as chamadas “mini-hídricas”). Posteriormente o setor da produção foi alargado a outras tecnologias, mas dessa questão tratarei noutra altura.

 

O DL 189/88 tinha duas vertentes, a vertente política e a vertente técnica. No que respeita à primeira, além da abertura a privados do setor de produção, deu-se início a uma maior aposta nas fontes renováveis, face ao aumento considerável que o consumo de eletricidade teve nessa altura. Isto inverteu o que tinha sido a norma desde o início dos anos 70: perda de peso das fontes renováveis (então apenas a hídrica) no mix energético nacional em relação às centrais fósseis.

 

Esta mudança de atitude alicerçou-se na coragem e visão estratégica do então Secretário de Estado da Energia, o Engº. Nuno Ribeiro da Silva, que também teve o respaldo do Ministro da Indústria, o Engº. Luís Mira Amaral, e, claro, do Primeiro Ministro Aníbal Cavaco Silva. A todos eles o setor deve muito por esta viragem, que se tem vindo a mostrar vencedora.

 

Na vertente técnica, um destaque deve ser feito ao Professor Domingos Moura - que infelizmente nos deixou em 2005, e com quem tive a honra de privar nestas e noutras questões - pela sua visão e conhecimento. Manifestei-lhe na altura a minha discordância por se incluirem questões técnicas num decreto‑lei, dado que estas iriam inevitavelmente sofrer alterações com a evolução da tecnologia, que não poderiam ser acompanhadas do ponto de vista jurídico.

 

O Professor Domingos Moura teve a oportunidade de, quando o levei a assistir à inauguração da Central do Terragido em Vila Real (1992), me dizer que eu tinha razão, mas na altura achou que era a melhor forma de se consolidar a mudança no setor. Também me manifestou a sua admiração por se estarem a construir centrais de 10 MW como a que tínhamos ido inaugurar, pois pensava que o setor se iria ficar por centrais de 2 a 3 MW. O facto de ele se ter “enganado” só vinha mostrar que o setor privado acreditava na mudança encetada, e que havia mais recursos hídricos do que ele supunha.

 

Inovador, mas simples, foi o sistema que foi encontrado pela equipa do Professor Domingos Moura para a remuneração da eletricidade produzida pelas novas centrais: a remuneração recebida era igual ao valor que o consumidor pagava pela eletricidade ao nível de tensão imediatamente superior ao que era ligada a central em causa. À medida que se aumenta o nível de tensão da ligação para consumo de eletricidade, baixa o preço unitário. Assim, nas centrais licenciadas ao abrigo do DL 189/88, uma central que se ligasse a 15 kV recebia pela tabela do consumidor a 30 kV, a 30 kV pela de 60 kV, e assim sucessivamente.

 

Mas os tempos foram passando, a tecnologia evoluíu e os investidores e operadores das redes ficaram mais confiantes, ao mesmo tempo que a descarbonização da economia foi ganhando importância como forma de combater as alterações climáticas.

 

Hoje em dia já se conseguem instalar centrais renováveis (de certas tecnologias) aptas a competir em mercado sem qualquer apoio, podendo mesmo receber pela produção de megawatt hora renovável valores abaixo das centrais térmicas, fazendo baixar o preço no mercado grossista.

 

Nem sempre o consumidor percebe estes ganhos que a produção de eletricidade renovável está a trazer, pois estes dissipam-se nos outros custos que a fatura da eletricidade incorpora. Também não tem forma de perceber que, sem estas centrais renováveis, a fatura mensal de eletricidade seria muito maior.

 

O que pretendo que fique retido neste texto é que o que esteve na origem do nosso mix de produção de eletricidade atual resultou do DL 189/88 e da visão e trabalho que todos os envolvidos tiveram. A todos eles devemos estar gratos.

 

Eu estou e nunca os esquecerei, em especial por terem acreditado que:

Portugal precisa da nossa energia.